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C. S. Lewis fala a um cachorro sobre luxúria

Às vezes, as pessoas pensam na moralidade cristã como uma camisa de forçacomo se Deus tivesse nos dado mandamentos arbitrários que precisamos guardar a fim de provar nossa devoção a ele. Seguir as instruções de Deus (especialmente em questões relacionadas à sexualidade) requer de nós sacrificar o que verdadeiramente queremos, ou abafar nossos desejos, a fim de mostrar a Deus quanto o amamos. Devemos desistir do que queremos e ao invés disso obedecê-lo.

Neste ano, ao ler as cartas selecionadas de C. S. Lewis, deparei-me com esta preciosidade numa carta de Lewis para seu amigo de longa data, Artur Greeves, em 12 de setembro de 1933. Lewis não era alheio à luxúria e à tentação sexual, e nem Greeves, o qual experimentou atração pelo mesmo sexo.

Mas Lewis acreditou que a perspectiva de que “a moralidade cristã é arbitrária” não vai fundo o suficiente. Ela não considera o que nós realmente queremos. Nem lida com o que Deus realmente quer. Ele usa seu cachorro como um exemplo:

Supondo que você está passeando com um cachorro e chega a uma catraca ou passa por um poste. Você sabe o que acontece (além de suas usuais cerimonias ao passar por um poste!). Ele tenta ir para o lado errado e fica com sua cabeça enrolada ao redor do poste. Você vê que ele não consegue prosseguir, e então o puxa para trás de volta. Você o puxa para trás porque você quer capacitá-lo a ir para frente. Ele quer exatamente a mesma coisa—a saber, seguir em frente: por essa mesma razão ele resiste sua puxada para trás, ou, se ele é um cachorro obediente, cede relutantemente como uma questão de dever que parece-lhe ser exatamente o oposto de sua própria vontade: embora de fato é somente por ceder a você que ele terá sucesso em chegar onde ele quer.

Queria ter encontrado essa ilustração antes, porque a teria incluído em “This Is Our Time”* como um exemplo de um dos meus pontos centrais do livro—que por trás dos mitos em que acreditamos e das ações que fazemos estão tanto aspirações quanto mentiras.

O cachorro acredita na mentira de que o único caminho para frente, o único caminho para ter o que quer, é seguir adiante. Lewis, o dono do cachorro, afirma essa aspiração do cachorro de ir para frente, mas ele precisa puxar o cachorro para trás para ele verdadeiramente fazer qualquer progresso.

Lewis fala a seu cachorro

Em seguida, Lewis explica o que falaria a seu cachorro, se de repente ele se tornasse um teólogo e estivesse frustrado pelo fato de seu dono contrariar sua vontade:

“Meu querido cachorro, se por sua vontade você significa o que você realmente quer fazer, isto é, seguir adiante na estrada, eu não apenas compreendo esse desejo mas compartilho dele. Adiante é exatamente aonde eu quero que você vá.

Por outro lado, se por sua vontade você significa sua vontade de apertar contra o colarinho e tentar força-se para frente em uma direção que é inútil—até compreendo isso é claro: mas somente porque eu compreendo isso (e toda a situação, a qual você não compreende) eu não posso compartilhar com isso. De fato o quanto mais eu simpatizo com seu verdadeiro anseio — a saber, o anseio em prosseguir — menos posso me simpatizar (no sentido de ‘compartilhar’ ou ‘concordar com’) sua resistência ao colarinho: porque eu vejo que isso está verdadeiramente tornando impossível a realização do seu verdadeiro anseio.”

Deus compartilha com o nosso maior desejo

Lewis aplica essa parábola à sua própria situação. Como seres humanos, ansiamos por felicidade, porém acreditamos nas mentiras que levam às más ações:

“Deus não apenas compreende mas compartilha o desejo que está na raiz de todo o meu mal — o desejo por plena e duradoura felicidade. Ele não me fez para nenhum outro propósito além do que desfrutá-la. Mas Ele sabe, e eu não, como ela pode ser obtida de forma real e permanente. Ele sabe que a maioria das minhas tentativas pessoais para alcançá-la estão verdadeiramente colocando-a cada vez mais longe do meu alcance. Com isso, portanto, Ele não pode simpatizar ou ‘concordar’: Sua simpatia com minha verdadeira vontade torna isso impossível. (Ele pode ter pena de minhas lutas mal direcionadas, mas isso é uma outra questão).”

Então, à pessoa que diz: “Eu preciso silenciar meus desejos, para obedecer a Deus”, Lewis diz: Não, Deus verdadeiramente compartilha de seu maior desejo. Ele está redirecionando seu caminho para que você possa verdadeiramente encontrar a alegria que você anseia.

E à pessoa que diz: “Deus me aprova como sou e simpatiza com todos os meus desejos”, Lewis diria: Não. Porque Deus aprova seu maior desejo, ele precisa categoricamente rejeitar suas ações e desejos pecaminosos, pois eles irão afastá-lo para sempre do que você realmente quer.

O anseio por alegria e a mentira do pecado

Qual é o ponto central então? Em primeiro lugar, Lewis diz que podemos olhar para trás em nossa história, e ver que há um anseio dado por Deus por trás de muitas de nossas ações pecaminosas.

“Olhando para trás, em qualquer pecado passado, posso sempre sentir que no âmago da minha paixão má há algo que Deus aprova e quer que eu sinta mais e não menos. Pegue um pecado de Luxúria. A sede esmagadora por prazer era boa e até divina: ela não era para ser calada (por assim dizer) e retraída.”

Mas agora Lewis expõe a mentira: a ideia de que se entregar à sua luxúria pecaminosa e ilícita cumprirá esse anseio:

“Mas [a sede] nunca será morta como eu tentei matá-la. Se eu me abster — se eu me submeter ao colarinho e dar a volta para o lado certo do poste — Deus estará me guiando tão rapidamente quanto Ele pode para onde eu terei o que realmente queria o tempo todo.”

O Deus gracioso e implacável

Em segundo lugar, Lewis diz que essa parábola se aplica à tentação futura, e ajuda-nos a entender por que devemos esperar que Deus seja implacável em condenar nosso pecado:

“Quando estamos pensando em um pecado no futuro, isto é, quando somos tentados, devemos lembrar que somente porque Deus quer para nós o que nós realmente queremos e sabe o único caminho para o conseguirmos, portanto, Ele deve, em um sentido, ser totalmente implacável com relação ao pecado.

Ele não é como uma autoridade humana a quem se pode implorar ou que pode ser encontrada em um humor mais tolerante. Quanto mais Ele o ama, mais determinado Ele deve ser em puxá-lo de volta de seu caminho que leva a lugar nenhum para Seu caminho que o leva aonde você quer, para Deus. Palavras de Hence MacDonald “O Pai que tudo pune e tudo perdoa”.

É impossível apelar ao “amor” de Deus para aprová-los em suas luxúrias. Deus não pode e não vai confirmar seus desejos e ações pecaminosos, pois fazê-lo tornaria impossível para você conhecer a verdadeira alegria.

Então o que você deve fazer quando cai em pecado? Pedir perdão e redirecionamento.

“Você pode ir pelo caminho errado novamente, e novamente Ele pode perdoá-lo: como o dono do cachorro pode livrar o cachorro depois que ele amarrou toda a coleira em volta do poste. Mas não há esperança no fim de chegar onde você quer ir, exceto indo no caminho de Deus, seguindo à maneira de Deus.”

Anseios e mentiras em nossa luxúria

Essa parábola sobre o cachorro nos ajuda a ver tanto os anseios como as mentiras no entendimento do mundo sobre sexualidade, e isso esmaga a ideia de que Deus quer matar nossa alegria ou extinguir todos os nossos desejos. Longe disso! Ao contrário, Lewis acredita que Deus puxa para trás a coleira precisamente porque Ele quer que encontremos o deleite que almejamos, nEle:

“Penso que alguém pode livrar-se totalmente da velha dúvida insistente — que levanta sua cabeça em toda tentação—que há algo a mais que Deus, algum outro território ao qual Ele nos proíbe de ultrapassar—algum tipo de deleite que Ele “não aprecia” ou apenas escolhe proibir, mas que seria real deleite se apenas nos fosse permitido tê-los. A coisa apenas não está lá. O que quer que desejamos é ou o que Deus está tentando nos dar o mais rápido que Ele pode, ou é uma falsa figura do que Ele está tentando nos dar—uma falsa figura que não nos atrairia por um momento se nós víssemos a coisa real.

Deus sabe o que queremos, mesmo em nossos atos mais vis. Ele é desejoso em dá-lo para nós. Ele não está olhando de fora em algum novo “gosto” ou “separado desejo de nós mesmos”. Somente porque ele nos deixou coisas verdadeiramente boas para nós desejarmos, somos capazes de irmos errados por avançar sobre elas em caminhos e de modos mal direcionados, gananciosos…

Então você pode muito bem sentir que Deus compreende nossas tentações—compreende-as muito mais do que nós. Mas não se esqueça de MacDonald novamente–“Apenas Deus entende o mal e o odeia.” Apenas o dono do cachorro sabe quão inútil é tentar prosseguir com a coleira enrolada ao redor do poste. Esse é o porquê de nós precisarmos estar preparados para encontrarmos Deus implacável e inamovivelmente proibindo-nos do que podem parecer para nós coisas muito pequenas e triviais.”

Deus entende nossas tentações. Ele conhece nossos corações melhor do que nós. Ele simpatiza com nossas tentativas ignorantes de encontrar alegria sem ele. Mas em seu grande amor, ele se recusa a aprovar-nos em nossos caminhos mal direcionados. Fazer isso seria abandonar-nos à coleira e ao poste, onde poderíamos estrangular a nós mesmos.

Trevin Wax é Editor no LifeWay Christian Resources e Editor-Chefe do The Gospel Project.

*Nota do tradutor: “Esta é a nossa vez” é um livro do autor deste artigo.

Tradução graciosamente feita pelo cooperador Lucas Vasconcelos Pinto. Seja um tradutor voluntário.


Fonte: thegospelcoalition.org

Published inSantificação